terça-feira, 2 de outubro de 2012


Seja sal, luz e fermento no mundo

Ide vós também para a minha vinha

O Povo de Deus, conduzido por Moisés através do deserto, rumo à Terra Prometida, passou por muitas e diversificadas crises. O próprio Moisés teve suas dificuldades, pois deveria conduzir uma multidão de gente de "cabeça dura". Como muitos líderes de todas as épocas da história, a conselho de seu sogro (Cf. Ex 18,1-27), aprendeu a compartilhar seu trabalho com homens escolhidos sem acumular, nas próprias mãos, o poder e as múltiplas tarefas que comportava o cuidado da viagem pelo deserto. Aarão, Josué e tantos outros encontraram seu lugar para viver ao lado de Moisés o chamado que lhes era próprio. 

O correr da história sagrada apresenta juízes, profetas e reis, todos chamados a exercer um serviço inestimável, chamados e inspirados por Deus. E que dizer de mulheres fortes, como Sara, Rute, Judite, Débora e muitas outras? Muitas foram as pessoas conduzidas pelo Espírito do Senhor, cuja lembrança a Escritura registra, para que as sucessivas gerações estivessem abertas ao apelo de Deus. E não foram poucas as circunstâncias e os desafios experimentados por todas estas pessoas, preciosas aos olhos de Deus. 

Os Evangelhos se abrem com a graça do chamado: Maria e José, Zacarias e Isabel, Simeão e a profetiza Ana, os discípulos de Jesus e, dentre eles, os doze apóstolos. E do meio do povo que seguia Jesus, conversões, curas, seguimento estrito do Senhor se multiplicam, oferecendo a moldura para toda aventura que se chame humana. Mais adiante, no Tempo do Espírito, relatado pelos Atos dos Apóstolos, entra na lista ler e rezar a Escritura Sagrada, ato de envolver-se com o mistério do chamado, a graça da vocação.

Homens firmes e provados, como os primeiros diáconos, convertidos como o eunuco da estrada de Gaza, o centurião Cornélio ou, mais do que todos, São Paulo, o apóstolo das gentes. Em todos, resplandece as armadilhas de amor tramadas por Deus para a graça do chamado. 
Na Igreja de Jesus Cristo, em todas as épocas e situações, a realidade do chamado se faz presente. Vocação foi o chamado de eremitas e monges, cuja solidão foi habitada pela presença do Senhor e pelas muitas pessoas que, desde o princípio, foram atrás deles, porque procuravam Deus. Sua vida suscitou seguidores e, até hoje, existem e sempre existirão pessoas chamadas ao silêncio e ao claustro. Vocação são os grandes carismas, a pobreza com São Francisco, a contemplação com São João da Cruz e Santa Teresa D’Ávila, a pregação com São Domingos.

Vocação foi o apelo de Deus para o surgimento das Ordens e Congregações Religiosas, criadas para responder aos desafios sociais, à educação das crianças, adolescentes e jovens, ao cuidado da saúde, como as famílias de pessoas consagradas que Deus inspirou no século dezenove e no início do século vinte ou muitas Congregações missionárias. Vocação são as novas formas de dedicação a Deus, chamadas “Comunidades Novas”. 

Desde o princípio, o Senhor chamou homens para o episcopado, o presbiterado e o diaconado, o ministério ordenado, para o serviço da Palavra, do Altar e do Pastoreio. Trata-se de um chamado específico dentro da Igreja, são as vocações que brotam em nossas comunidades paroquiais. 

Se alguém não se sentir tocado por tais “vagas” de trabalho, certamente é porque seu lugar, de uma imensa e qualificada maioria, é a do leigo ou leiga, presente na Igreja, comprometido com os valores do Evangelho, vocação magnífica para ser sal, luz e fermento no mundo, oferecendo-se como hóstia agradável a Deus. Mais ainda! Que lugar carregado de dignidade é aquele ocupado pelas pessoas chamadas ao matrimônio, homens e mulheres encarregados de realizar, nos lares cristãos, a imagem do relacionamento existente na família mais perfeita, Pai e Filho e Espírito Santo. 

Existe um mistério que toca, de perto, todos os homens e mulheres batizados, sem exceção, no olhar pessoal de Deus, nosso Criador e Guia, que quer dizer, de novo, neste mês dedicado às vocações (Cf. Mt 20,1-16):“Por que estais aí o dia inteiro desocupados? Ide vós também para a minha vinha”. Deus acompanha os fiéis e os cumula com Sua inesgotável bondade, restaurando o que por Ele mesmo foi criado e conservando o que foi restaurado. Há muito a fazer, quando as pessoas, mesmo quando não se expressam assim, gritam insistentemente (Jo 6,28): “Que devemos fazer para realizar as obras de Deus?” Quem acolhe Sua graça não pode ficar indiferente! O mundo em que vivemos clama pela nossa resposta ao chamado de Deus e pelo nosso testemunho qualificado, grita pela nossa vocação!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012


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As dores do crescimento

Paciência é fundamental na arte de crescer
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Ele era um menino cheio de vida, gostava de correr no campo, jogar bola, apreciar as cores da natureza; os detalhes dos acontecimentos não lhes passavam despercebidos. No entanto, muitas vezes, acordava durante a noite chorando com dores nos braços e nas pernas. Os pais, preocupados em busca da cura, foram aconselhados a deixar o tempo passar, pois lhes diziam: "são as dores do crescimento". 

Quando meu amigo me contou essa fase de sua vida, fiquei o resto do dia com esta lição. Na verdade, crescer dói, porque exige mudanças. Mudar é exigente, pois nos desinstala, nos tira da zona de conforto e nos lança para o desconhecido. Aliás, a mudança nos rouba algo que passamos a vida inteira tentando conquistar: a segurança. Naturalmente, trabalhamos, estudamos, investimos nos relacionamentos e fazemos tantas outras coisas visando a segurança de uma vida tranquila e estável neste mundo. 

Gostamos de saber qual é o terreno que nossos pés estão pisando e onde vai nos levar o caminho que optamos por seguir. É por isso que nos sentimos tão ameaçados quando a mudança chega, seja por escolha, necessidade ou até mesmo obrigação. É como se o chão fugisse dos nossos pés. É preciso ter fé, arte e generosidade para saber recomeçar sem fugir do desafio. É nesta hora que o crescimento nos estende a mão e costuma caminhar, lado a lado, com a mudança; ele quer nosso bem, mesmo que, nem sempre, seja compreendido. 

O fim de um relacionamento, por exemplo, geralmente é um momento de dor, mas também de crescimento se ficarmos com o melhor que a pessoa nos ofereceu. Uma mudança inesperada de emprego também é uma ótima oportunidade para crescer e aprender coisas novas, mudar de cidade, de escola, ter de frequentar novos ambientes, conquistar novas amizades. Tudo isso, embora nos custe certo sacrifício, também nos dará prazer e nos fará crescer se soubermos acolher a novidade de coração aberto.
Até mesmo a dor pela morte de uma pessoa querida, por mais difícil que seja, pode nos proporcionar crescimento se conseguirmos superar o luto com o olhar fixo na ressurreição. A vida segue seu rumo; entre perdas e conquistas, dores e alegrias, surgem as oportunidades para crescer a cada dia, como surgem os primeiros raios de sol a cada amanhecer. Saber conciliar os acontecimentos é uma graça, mas também um desafio. Aliás, crescer é um dos maiores desafios do ser humano, até o próprio nascimento já é uma exigência ao nosso ser; e quando se fala em crescer para o amor e para a sabedoria, o processo costuma ser lento, além de ser uma questão de escolha e paciência constantes.

Paciência é fundamental na arte de crescer, pois não se atinge a estatura adulta de um hora para outra. Nos relacionamentos, é comum, mesmo entre as pessoas que se amam, aparecerem os conflitos. Na maioria dos casos, o motivo é a falta de paciência com o crescimento do outro. Neste caso, quem conseguir respeitar a opinião alheia, mesmo sem abrir mão da sua e aguardar o momento em que Deus dará luz, fazendo com que a harmonia vença, certamente crescerá mais do que quem optar por continuar defendendo seu ponto de vista. Mesmo que, agindo assim, enfraqueça a amizade ou até cause feridas. É preciso ser amigo do tempo, também é importante lembrar que o sofrimento, causado pela mudança, mantém as pessoas mais humildes e vigilantes para amar e servir mais, priorizando o que realmente vale a pena. 

Os momentos de maiores provações em minha vida foram quando percebi mais mudanças no meu jeito de ser e agir, ou seja, quando cresci. Recordo-me de uma época de enfermidade, por exemplo, quando eu dependia da ajuda de pessoas até para realizar as coisas mais comuns como prender o cabelo, vestir a roupa e até me alimentar. Depois, tornei-me muito mais solícita às necessidades alheias. Hoje, quando vejo alguém limitado neste sentido, naturalmente me antecipo em ajudar. Talvez seja por isso que o Senhor diz em Sua Palavra: "A minha graça te basta, porque o meu poder se manifesta na fraqueza" (2 Cor 12,9).

Acredito que é assim quando Deus permite que a dor nos visite, pois, certamente, está nos oferecendo a oportunidade de crescermos em algum aspecto de nossa vida. Que saibamos acolher o desafio com serenidade e confiança, unindo nosso sacrifício ao sofrimento que o próprio Deus experimentou ao morrer por amor a cada um de nós. Enquanto a humanidade procura soluções rápidas e imediatas para o sofrimento, nós cristãos devemos buscar forças na cruz de Cristo. É nela que podemos encontrar resposta para as nossas dores e anseios.

Mais do que um símbolo de sofrimento, a cruz é a nossa esperança e a certeza de que Deus não nos criou para as coisas pequenas e passageiras deste mundo, mas para o infinito, para uma vida plena e feliz. Portanto, coragem, não tenhamos medo de crescer! A dor do crescimento é passageira e a felicidade conquistada pela perseverança é eterna. Estamos juntos.